segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Guardanapo

 
Nunca fiz o tipo encabulada, aliás, pelo contrário, sempre estive mais pra "atiradinha", como diziam meus amigos.
Ali, sentada frente a ela, sentia que o esforço de manter o olhar longe não partia só de mim.
Todos conversavam sobre mil coisas e pareciam sequer notar a tensão que estava rolando. Aliás, não estavam mesmo notando.
Não sei dizer sobre o que falavam, então tudo o que podia fazer era rir e acenar quando despertava com alguém olhando em minha direção ou mesmo quando ouvia o meu nome.
 
Um toque de sua mão na minha...
- Divide uma coca comigo, Pam?
-Claro.
E me perdi no sorriso que veio em seguida. Tanto, que demorei pra notar que lá na outra ponta da mesa falavam de mim.
-Hey, Pam! E suas histórias... Parou de escrever? - perguntaram.
-Ando sem inspiração.
-Bebe umas aí que a inspiração vem - todos riram. E dispersaram em seguida.

Me deparei com o olhar dela no meu.
-Então é a bebida que inspira as suas histórias? - ela perguntou
-Na verdade, não é exatamente a bebida. Mas as histórias que ela me rende já ajudaram bastante.
-Então tudo o que você escreve é baseado em fatos alcoólicos reais? - falou em tom de brincadeira
-Não - sorri de volta. Sem graça, confesso.- Também escrevo o que eu gostaria muito que acontecesse, por exemplo. Aí acaba partindo da minha imaginação e não preciso beber pra imaginar nada.
-Escreveria alguma coisa agora?
-Como assim agora?
-Ué, agora. Ou não consegue?
Sorri e, instintivamente, abri a bolsa, peguei uma caneta e um guardanapo. Estava há algum tempo sem escrever, e me sentia ridiculamente adolescente fazendo aquilo. Não tenho mais idade pra ceder a esses desafiozinhos. Mas também não fazia o meu tipo desperdiçar as oportunidades.

"Teu cheiro me instiga, tua presença me fascina, tua voz me arrepia, teu olhar me cativa... Friozinho na barriga gostoso esse que você me dá!
Não, eu não te amo...e nem quero porque amar dá trabalho e dor de cabeça, muita dor de cabeça. Mas certamente te quero, com uma curiosidade crescente que não permite que essa minha vontade sequer diminua e muito menos passe. Quero provar o que você quiser deixar que eu prove de você e quando não quiser mais, quero te convencer a me deixar ir além.
Quero sentir na minha pele o teu cheiro e saber, com a minha boca, que gosto tens.
Não quero um "pra sempre" nem sentimentos, quero desejo e vontade, momento...
Agora...
sem expectativas ou fugas da realidade, quero, com os pés no chão, saber que não vai durar
e não me importar, porque eu não te quero pra mim.
Eu só te quero."

Enquanto ela lia, sua pele enrubescia e ela parecia encolher devagar e discretamente.
Ao terminar, levantou a cabeça e, num misto de vergonha e ousadia disse
-Adorei, mas não falta alguma coisa?
Sorri um sorriso mais largo do que qualquer outro que tenha dado a noite inteira.

E ninguém pareceu se importar quando levantamos e saímos para terminar a minha história.

5 comentários:

  1. Devo admitir que essa história é tão "minha" quanto esclarecedora. Estou passando por uma situação similar a essa, porém, que se arrasta através dos corredores, salas e estacionamento da faculdade. É quase como algo proibido que sei não amar, mas que desejo. E de maneira tão intensa quando desesperadamente sutil.
    Ao ler a forma que desenha cada linha, acho que me encontrei como amante, como uma mulher que sempre achou ter tudo sob controle e estar no poder das situações/relações, mas que agora se depara em um momento onde desejava ser uma adolescente escrevendo bilhetes em um guardanapo. Inclusive, desejo a chance de escrever meu próprio guardanapo e entregar a tal pessoa. rs
    Adorei, espero que outras inspirações como essa surjam pelo caminho.

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    1. Jessica, não só fico feliz como me sinto honrada por tamanha identificação com o que escrevi! Gosto justamente dessa magia que a escrita nos permite, que é tocar pessoas e contar histórias que são tão reais quantos nós msm, ainda que nem a gente saiba disso...
      Obrigada por ler e espero que continue acompanhando! E quando criar coragem para escrever e entregar seu próprio guardanapo, me conte o desfecho, ok? ;)

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    2. Pâmela, tenho guardado o "guardanapo" sempre comigo para que em algum momento o entregue. Mantenho ele pronto como um soldado que sempre mantém uma bala para si mesmo em meio a guerra, tenho esperado apenas o momento certo ou mais adequado. Mas temo, pois além de algo que poderíamos chamar de proibido, a pessoa representa o feudal de minha submissão e enquanto espero "ordens", espero também a coragem em dar forma a tudo isso e encarar as consequências. Sejam elas doces ou amargas... Mas, com certeza, verá algo a respeito caso aconteça e eu alertarei você sobre o fato. rs

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    3. Neste caso, minha cara conterrânea...aguardo ansiosamente pelo seu alerta rs
      Boa sorte. <3

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  2. Como sempre não me arrependo de esperar pelo próximo! *-* Sua fã numero um e você sabe disso ; )

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